sábado, 28 de abril de 2012

Em Defesa do Marxismo e da Experiência Socialista - JÚLIO MOREIRA

Artigo retirado da edição atual da revista Crítica do Direito (Número 1, Volume 35). Disponível no link: http://www.criticadodireito.com.br/todas-as-edicoes/numero-1-volume-35/em-defesa-do-marxismo-e-da-experiencia-socialista



“Que partido de oposição não foi acusado de comunista por seus adversários no poder? Que partido de oposição, por sua vez, não lançou a seus adversários de direita ou de esquerda a pecha infamante de comunista?”
Marx e Engels
“A doutrina de Marx suscita em todo o mundo civilizado a maior hostilidade e o maior ódio de toda a ciência burguesa (tanto a oficial como a liberal), que vê no marxismo uma espécie de ‘seita perniciosa’. E não se pode esperar outra atitude, pois, numa sociedade baseada na luta de classes não pode haver ciência social ‘imparcial’.”
Lênin
“Sempre estivemos contra a crítica inadequada a Stalin, feita a partir de uma posição falsa e com métodos errôneos.”
Partido Comunista da China


O pensamento social dominante é condicionado pelas forças dominantes na sociedade. A história jamais será imparcial, pois precisa ser contada por alguém. Desde que a sociedade se dividiu entre opressores e oprimidos, a história predominante é a história dos opressores.
Os homens sempre foram em política vítimas ingênuas do engano dos outros e do próprio e continuarão a sê-lo enquanto não aprenderem a descobrir por trás de todas as frases, declarações e promessas morais, religiosas, políticas e sociais, os interesses de uma ou de outra classe (LENINE, 1984a, p. 94).
Em 1992, um certo funcionário do Departamento de Estado dos Estados Unidos lançava aos ventos a tese do “fim da história”, pressupondo, com estratagemas dignos de Schopenhauer[1], a derrota eterna do socialismo e a vitória eterna do capitalismo. Em outras palavras: critiquemos o socialismo, mas não critiquemos o capitalismo, porque, por problemas que existam, não há nada a fazer contra ele.
Assim, a história utiliza de premissas falsas e da manipulação semântica, pressupondo na expressão “socialismo real” que as experiências socialistas no mundo foram negativas e que não é possível aplicar na prática a teoria marxista. Isso ficou impregnado de tal maneira que até críticos do capitalismo admitem essa terminologia, abrindo os flancos para a falsa proclamação de vitória do capitalismo. A manipulação semântica vai mais longe, quando os ideólogos do capitalismo, no pós II Guerra Mundial, aproveitaram-se da derrota do nazi-fascismo para cunhar o termo totalitarismo, que correspondia a tudo que não se combinasse com a concepção idealizada de democracia liberal. Assim, lançava-se um estratagema de alternativa forçada: como era óbvio que ninguém ousaria defender o monstro do totalitarismo, restava apenas comprar a ideia de democracia liberal. De um lado, o modelo de “democracia” estadunidense; do outro, os “totalitarismos” do nazismo, socialismo, comunismo, etc. Essa máquina de manipulação anti-histórica consegue igualar as experiências socialistas ao nazismo.
A história do capitalismo é também a história da luta pela sua superação. Irrompendo contra as oposições utópicas e moralistas aos efeitos do capitalismo sobre os trabalhadores, Marx e Engels apontam o caminho científico para a transformação.
Marx determinou a tarefa essencial da táctica do proletariado em rigorosa conformidade com todas as premissas da sua concepção materialista-dialéctica do mundo. Só o conhecimento objectivo do conjunto de relações de todas as classes, sem excepção, de uma dada sociedade e, por conseguinte, o conhecimento do grau objectivo de desenvolvimento desta sociedade e das relações entre ela e outras sociedades. (LENINE, 1984b, p. 204)
A luta de posições, muitas vezes antagônicas, sempre foi parte dos processos de organização revolucionária. A Associação Internacional dos Trabalhadores, onde estavam Marx e Engels, se deu em meio a confrontos com os anarquistas. A Comuna de Paris, em 1871, é um marco que confirma as posições marxistas. Depois, abre-se a luta de Lênin contra o reformismo e o oportunismo que passaram a dominar a II Internacional. A Revolução Russa demonstra a justeza das posições de Lênin sobre os reformistas e oportunistas da II Internacional.
A construção da experiência revolucionária na Rússia não se deu sem duras contradições. Em vida, Stalin enfrentou várias tentativas de eliminação e traições dentro do Partido Comunista da União Soviética. Com sua morte, em 1953, Kruschov assume o caminho para a restauração capitalista na Rússia, abrindo uma luta com o Partido Comunista da China. Até 1976, a justeza das posições do PCCh é confirmada pela experiência única da Revolução Cultural, levando adiante os princípios do marxismo-leninismo. A partir de 1976, com a morte de Mao Tsetung, abre-se o caminho para a restauração do capitalismo na China. Por outro lado, surge o marxismo-leninismo-maoísmo a partir do chamado Pensamento Mao Tsetung.
Dois conceitos chaves nessas lutas são oportunismo e revisionismo. Lênin apontava que, nas condições do capitalismo monopolista, “um pequeno círculo da burocracia operária, da aristocracia operária e de companheiros de jornada pequeno-burgueses podem receber algumas migalhas dos grandes lucros da burguesia” (LENINE, 1984c, p. 283). Trata-se de uma forma desenvolvida pelo capitalismo de destruir seus inimigos por dentro, o que se revelou mais eficaz que travar apenas a confrontação direta. O conteúdo do oportunismo, que passa a ser uma linha de atuação nos movimentos operários é “a colaboração das classes, a renúncia à ditadura do proletariado, a renúncia às ações revolucionárias, o reconhecimento sem reservas da legalidade burguesa, a falta de confiança no proletariado, a confiança na burguesia” (LENINE, 1984c, p. 283).
Além de afirmar que a luta de posições é inerente aos movimentos revolucionários – o que decorre da universalidade da contradição como lei fundamental do materialismo histórico-dialético – demonstramos que a única forma de resolver qual é a posição correta é a sua aplicação na prática. Isso reafirma Mao Tsetung (1979a, p. 69):
É somente chegando à prática social (dentro do processo da produção material, da luta de classes, das experiências científicas), aos resultados que esperavam, que os homens recebem a confirmação da verdade de seus conhecimentos.
Em seguida:
O marxismo-leninismo é reconhecido como verdade não somente porque essa doutrina foi cientificamente elaborada por Marx, Engels, Lênin e Stálin, mas porque foi confirmada pela prática ulterior da luta revolucionária de classe e da luta revolucionária pela libertação da nação. (1979a, p. 79)
Uma tal experiência histórica, em tempos de imperialismo, teve um poder incrível de influenciar as pessoas dos países inseridos na troca capitalista mundial. Especialmente após a II Guerra Mundial, pintar o socialismo como algo muito ruim era tarefa essencial para o capitalismo na batalha ideológica. Uma forma de fazê-lo, e que é feita constantemente até hoje, é atacar a figura pessoal dos dirigentes. Isso só pode ser feito numa concepção de história que dissocia os indivíduos do contexto social, somada à manipulação psicológica, criando monstros sem associar com a posição de classe que cada um ocupava e a quem cada um servia. Cabe trazer a passagem de Stalin (1938) sobre o idealismo histórico:
[...] a ciência histórica, se pretende ser uma verdadeira ciência, não deve continuar reduzindo a história do desenvolvimento social aos atos dos reis e dos chefes militares, aos atos dos "conquistadores" e "avassaladores" de Estados, mas deve ocupar-se, antes de tudo, da história dos produtores dos bens materiais, da história das massas trabalhadoras, da história dos povos.
 Lênin, Stalin e Mao Tsetung são os mais demonizados, exibidos com os mais excêntricos hábitos capitalistas capazes de causar antipatia a qualquer pessoa! Não é preciso falar dos estudos sobre a capacidade de formatação ideológica da indústria cultural capitalista, nem citar filmes e livros em que a experiência revolucionária de bilhões de pessoas é reduzida às maluquices e excentricidades atribuídas aos dirigentes.
Somava-se a isso a particular consciência dos ideólogos capitalistas de que é mais eficaz destruir a revolução por dentro do que atacando de fora. Três anos depois da morte de Stalin, em 1956, Kruschov apresentou, no famoso XX Congresso do PCUS, um “relatório secreto” denunciando uma série de crimes supostamente praticados por Stalin e o que chamava de culto à personalidade. O texto relatório sequer fora apresentado. Mesmo assim, causou impacto nas direções comunistas, nos militantes e nos intelectuais em todo o mundo. Grande parte das direções não estava habituada ao método correto de aprofundar e resolver as divergências e lutas internas. Muitos – inclusive Kruschov, que era um pérfido puxa-saco de Stalin quando este era vivo – que sustentavam uma crença na figura de Stalin sem profunda convicção e fundamento, passaram da mesma maneira a odiá-lo. Isso abriu o caminho para a negação, não de Stalin, mas dos princípios do comunismo. Exemplo claro se passou no Brasil com a debandada reformista de Prestes e seus seguidores.
Intelectuais proeminentes, especialmente na Europa, apartados da prática revolucionária e recebendo informações distorcidas, acolheram prontamente essa manipulação, como o demonstra essa fala do italiano Umberto Cerroni (apud CALDAS, 2006, p. 25):
O XX Congresso acolho com entusiasmo, com um entusiasmo que em parte se esmaga e se contradiz com a dor autêntica e muito humana de tantos militantes que se sentem maculados de sangue pelo realatório secreto.
Tudo isso não levou a nada mais que à negação dos princípios da ação revolucionária e dos métodos de direção comunista. Serviu para formar um consenso de refutação da aplicação prática do marxismo-leninismo, e lançar as várias vertentes de um “socialismo democrático”, que nada mais significa que a defesa dos princípios da democracia liberal (separação de poderes, eleições livres, cretinismo parlamentar, etc.) sob rótulos de socialismo.
Um outro consenso formou-se sobre a produção e reprodução de um conceito – o “stalinismo”. Falamos em “produção” de um conceito pelos seus próprios críticos, porque os que defenderam ou defendem corretamente a figura de Stalin jamais utilizaram esse termo. Ele é usado, muitas vezes, não para refutar Stalin, mas sim os princípios do comunismo. Em política vulgar é usado para nomear a prática de qualquer político que impõe sua vontade individual sem discussão. Na academia em Ciências Humanas, ser contra o “stalinismo” acabou se tornando um senso comum e pressuposto indispensável para quem quiser se manter numa posição confortável e estável, sem ser duramente criticado, e desde que não ligue muito para a reflexão sobre suas convicções e princípios.
E o que queremos dizer por “defender corretamente a figura de Stalin”? Que não estamos buscando uma posição confortável sem princípios. Que não podemos seguir até hoje dando corda à manipulação que foi o “relatório secreto” de Kruschov. Que não podemos seguir a linha de demonização individual dos dirigentes socialistas, nem tampouco sua glorificação individual sem convicção histórica e científica. Que a maior parte das críticas (ataques) a Stalin não fazem avançar a crítica transformadora da sociedade e levam inevitavelmente à negação do marxismo e da experiência socialista. Que não refutamos a experiência única que viveram bilhões de pessoas ao longo do século XX, na construção do socialismo.
Após o “relatório secreto” e seus impactos, abriu-se a luta entre o PCUS e o PCCh, expressa em documentos importantíssimos para a avaliação da experiência socialista – e ainda pouco conhecidos no Brasil. Do lado chinês, trata-se da carta de 25 pontos intitulada Proposição acerca da linha geral do Movimento Comunista Internacional, de 14 de junho de 1963, e de nove comentários temáticos sobre a Carta Aberta do PCUS, de 14 de julho de 1963. Esses documentos foram publicados pela primeira vez no Brasil (não por acaso) apenas em 2003, sob o título A Carta Chinesa – a grande batalha ideológica que o Brasil não viu.
Um dos nove comentários é Sobre o problema de Stalin. Ali fica colocada a posição do PCCh:
O Partido Comunista da China sempre considerou que é necessário analisar de maneira cabal, objetiva e científica os méritos e erros de Stalin, empregando o método do materialismo histórico e apresentando a história tal como é, e que não se deve empregar o método do idealismo histórico, tergiversar e falsificar arbitrariamente a história, nem negar Stalin de maneira subjetiva, grosseira e total. (PCCH, 2003a, p. 143)
Quando Kruschov tergiversa a história e nega por completo Stalin, é natural que tenhamos o ineludível dever, pelo bem dos interesses do movimento comunista internacional, de sair em defesa de Stalin. (PCCH, 2003a, p. 146)
No tumulto histórico causado pelo XX Congresso do PCUS, o PCCh era o que mais possuía condições para avaliar a experiência da Rússia sob Stalin e prosseguir no caminho do socialismo. Isso porque, sob a direção de Mao Tsetung, o PCCh, desde a sua fundação na década de 20, vinha se provando nos métodos de direção e no tratamento correto das contradições. Em outras palavras, eles puderam, como ninguém antes, aplicar os preceitos da filosofia marxista – o materialismo histórico e dialético – a todos os campos da atividade humana, inclusive aos métodos de direção. Essa consciência da filosofia na prática já havia  sido demonstrada em dois textos de 1937: Sobre a prática e Sobre a contradição, cuja leitura, um tanto negligenciada e pouco acessível na atualidade, é essencial para qualquer pessoa que queira conhecer honestamente o marxismo – fugindo das falsificações, superficialidades e preconceitos carregados pelos mais eminentes e graduados professores da academia.
Esse caminho aponta e demonstra cientificamente que a contradição é inerente e interna a todos os fenômenos (todo fenômeno traz em si o seu oposto); que uma realidade possui várias contradições e é preciso distinguir, nelas, a contradição principal que condiciona todas as outras, e distinguir, em cada contradição, o aspecto principal ou dominante; que um aspecto dominado da contradição pode se tornar o seu oposto – o dominante – gerando uma realidade diferente da anterior; que, embora a contradição esteja em tudo, nem todas as contradições são antagônicas.
A partir do fato de que a contradição está em tudo, Mao Tsetung demonstrava que a luta entre capitalismo e socialismo não se dava apenas no amplo espectro da sociedade, mas inclusive no seio da direção comunista. Nenhuma direção – nem mesmo a do próprio PCCh – estava imune ao oportunismo, ao revisionismo e à restauração  capitalista. E ainda, que, mesmo onde o Partido Comunista tivesse tomado o poder e iniciado a construção do socialismo, o capitalismo continuava presente, e era preciso lutar contra ele até o comunismo:
A sociedade socialista abarca um período histórico muito longo. Nesta sociedade ainda existem classes, a luta de classes e a luta entre o caminho do socialismo e o do capitalismo. A revolução socialista realizada só na frente econômica (na propriedade sobre os meios de produção) não é suficiente nem sólida. É necessária, ademais, uma revolução socialista completa nas frentes política e ideológica. (PCCH, 2003b, p. 438).
A compreensão de que nem todas as contradições são antagônicas leva, no âmbito da luta de classes, à necessidade de distinguir as “contradições entre nós e o inimigo” e as “contradições no seio do povo”. Cada uma impõe um método correto para resolvê-las.
As contradições entre nós e o inimigo e as contradições no seio do povo, por serem de natureza diferente, requerem métodos distintos para resolvê-las. Em poucas palavras, nas primeiras é questão de traçar uma clara distinção entre nós e o inimigo, enquanto que nas segundas se trata de uma questão de estabelecer uma distinção precisa entre o correto e o errôneo (TSETUNG, 1999, p. 57).
Negando a ideia abstrata de democracia, demonstrava-se que todo Estado expressa a democracia apenas entre aqueles que exercem o poder, e ditadura contra seus inimigos de classe. Por mais que fale em democracia no sentido abstrato, qualquer Estado capitalista é de fato uma ditadura contra os trabalhadores. Já a ditadura democrática popular na China se fundamentava numa democracia para o povo e ditadura para as classes que pretendiam restaurar o capitalismo. A primeira função dessa ditadura era
[...] reprimir, dentro do país, as classes e elementos reacionários, os exploradores que opõem resistência à revolução socialista, reprimir os que sabotam a edificação socialista, isto é, resolver as contradições entre nós e o inimigo dentro do país. (TSETUNG, 1999, p. 57)
Entre o povo e dentro das direções partidárias, havia dois tipos de desvios na maneira correta de tratar a contradição com o inimigo: a maneira de pensar direitista não faz essa distinção e trata os inimigos como amigos; já os que pensam de maneira esquerdista “exageram o alcance das contradições entre nós e o inimigo até tal grau que tomam certas contradições no seio do povo por contradições entre nós e o inimigo e consideram contra-revolucionárias a pessoas que na realidade não o são” (TSETUNG, 1999, p. 65).
As contradições no seio do povo não podem ser resolvidas apenas com medidas administrativas e coercitivas. O elemento fundamental é o trabalho educativo e persuasivo.
Ao advogar pela liberdade dirigida e pela democracia guiada pelo centralismo, não queremos dizer de modo algum que, no seio do povo, devam resolver-se empregando medidas coercitivas as questões ideológicas e os problemas relativos à distinção entre o certo e o errado (TSETUNG, 1999, p. 59)
Qual seria o método correto para resolver essas contradições? “Partir do desejo de unidade, resolver as contradições através da crítica ou luta e alcançar assim uma nova unidade sobre uma nova base” (1999, p. 59).
Voltando a Stalin, o PCCh analisa, entre outros erros:
Na luta tanto dentro como fora do Partido, às vezes e em alguns problemas, Stalin confundiu duas categorias de contradições de distinto caráter, isto é, contradições entre os inimigos e nós e contradições no seio do povo, e confundiu os métodos diferentes para resolvê-las. (PCCH, 2003a, p. 144).
Não obstante, e ainda que os comunistas chineses tenham sentido na própria carne as consequências de alguns erros de Stalin, seu método nunca foi de atacar sua direção, mas sim seus erros, buscando corrigir-lhes na prática. “Para todos os comunistas, as experiências históricas tanto positivas como negativas são benéficas, sempre que sejam acertadamente resumidas de acordo com a realidade histórica e não tergiversando-a” (2003a, p. 145). E ainda, “os méritos e erros na vida de Stalin são uma realidade objetiva histórica. Comparados seus méritos e seus erros, pesam mais os primeiros que os últimos” (2003a, p. 145).
Demonstra o PCCh que Stalin conduziu o povo soviético na linha da industrialização socialista e da coletivização da agricultura; na grande vitória da guerra antifascista (dizemos: representada, aliás, pela correta estratégia e pelo heroísmo inapagável da Batalha de Stalingrado); na luta contra o oportunismo e a sustentação do marxismo-leninismo, que impulsionou a construção, em todo o mundo, de partidos comunistas armados com a ciência  e o método luta eficaz contra o capitalismo; no avanço da obra teórica marxista; numa política externa correspondente com o internacionalismo proletário e com grande ajuda às lutas dos povos de todo o mundo.
Com a análise correta da realidade, o conhecimento científico da contradição aplicado aos métodos de direção, e a compreensão de que a construção do socialismo não  se dá apenas no plano econômico, mas sobretudo nas frentes política e ideológica, o PCCh lançou, em 1966, uma experiência inédita na humanidade: a Grande Revolução Cultural Proletária, como um processo de educação e empoderamento das massas voltado a colocar em questão os próprios dirigentes, revolucionando e reavivando o caminho do socialismo e combatendo as tendências feudais e burguesas que permaneciam mesmo após vários anos da revolução de 1949. A Revolução Cultural perdura até 1976, quando, após a morte de Mao Tsetung, um golpe de Estado coloca Deng Xiaoping no poder e encarcera a direção maoísta.
Essa dura condição da luta pelo socialismo já estava adequadamente colocada em 1963. Pedimos licença para a longa transcrição, já que qualquer redução retiraria seu sentido integral:
A luta de classes, a luta pela produção e a experimentação científica são três grandes movimentos revolucionários para cosntruir um poderoso país socialista. Estes movimentos constituem uma real garantia de que os comunistas se verão livres do burocratismo e estarão imunes contra o revisionismo e o dogmatismo, e permanecerão sempre invencíveis. São uma garantia segura de que o proletariado será capaz de unir-se com as amplas massas trabalhadoras e praticar uma ditadura democrática. Se, na ausência destes movimentos, estivesse permitido que surgissem os latifundiários, camponeses ricos, contra-revolucionários, elementos maus e ogros de todo tipo, enquanto nossos quadros fechassem os olhos a tudo isto e em muitos casos inclusive não distinguissem entre os inimigos e nós, mas sim colaborassem com eles e ficassem corrompidos e desmoralizados; se com isso nossos quadros fossem arrastados ao campo inimigo ou o inimigo lograsse colar-se em nossas fileiras, e se muitos de nossos operários, camponeses e intelectuais fossem deixados indefesos perante as táticas brandas e as táticas duras do inimigo, então não seria necessário muito tempo, talvez só alguns anos ou uma década, ou várias décadas quando muito, para que ocorresse inevitavelmente uma restauração  contra-revolucionária em escala nacional, o partido marxista-leninista se transformasse em partido revisionista ou partido fascista, e toda a China mudasse de cor (TSETUNG, apud CARVALHO, 2006, p. 93)
Afinal, foi exatamente o que aconteceu, 13 anos depois, na China, representando um problema muito mais amplo, o fim da primeira grande onda da experiência socialista. Não que Mao Tsetung fosse um visionário, apenas estava munido da mais avançada aplicação do método materialista dialético, podendo visualizar o aspecto oposto da contradição. De maneira nenhuma, porém, devemos fazer coro ao “fim da história”. Afinal, já estava claro, também, que a revolução é um processo longo de derrotas e vitórias. Em 1938, Stalin mostrava que a revolução e o socialismo não são fruto da vontade arbitrária de certas pessoas ou grupos, mas do próprio desenvolvimento histórico das sociedades capitalistas.
Ora, se o mundo se acha em incessante movimento e desenvolvimento e se a lei desse desenvolvimento é a extinção do velho e o fortalecimento do novo, é evidente que já não pode haver nenhum regime social "irremovível", nem podem existir os "princípios eternos" da propriedade privada e da exploração, nem as "idéias eternas" de submissão dos camponeses aos latifundiários e dos operários aos capitalistas.
Os erros cometidos nas experiências socialistas do século XX (não nos referimos aos erros anunciados – e criados – pela versão dominante na história), não são capazes de abalar essa certeza histórica e científica, e muito menos de permitir que se declare a vitória do capitalismo.
É necessário um período muito longo para resolver o problema de “quem vencerá a quem”: o socialismo ou o capitalismo nas frentes política e ideológica. Para conseguir o êxito não bastam uns decênios, se necessitarão de cem a centenas de anos. Quanto ao tempo, mais vale preparar-se para um período maior que um menor; quanto ao trabalho, mais vale considerar preferentemente a tarefa como difícil do que como fácil. Pensar e atuar desta maneira é mais proveitoso e menos prejudicial. (PCCH, 2003b, p. 438)
Quão diferente é a lógica dos imperialistas da lógica do povo! Provocar distúrbios, fracassar, voltar a provocar distúrbios, fracassar de novo... até à sua ruína – tal é a lógica dos imperialistas e de todos os reacionários do mundo perante a causa do povo, e eles jamais marcharão contra tal lógica. [...] Lutar, fracassar, lutar de novo, fracassar de novo, lutar outra vez... até à sua vitória, eis a lógica do povo, e este também jamais marchará contra tal lógica. (TSETUNG, 1979b, p. 665).
Marx, Engels, Lênin, Stalin e Mao Tsetung estão tão vivos na atualidade, que o capitalismo os continua matando e enterrando, a cada dia, a cada minuto.

REFERÊNCIAS
CALDAS, Camilo Onoda. Perspectivas para o direito e a cidadania. O pensamento jurídico de Cerroni e o marxismo. São Paulo: Alfa Omega, 2006.
CARVALHO, Albênzio Dias de. O revisionismo albanês de Amazonas e sua crítica “demolidora” do maoísmo. Rio de Janeiro: Difusora, 2006.
LENINE, V.I.. As três fontes e as três partes constitutivas do marxismo. In: _____. Obras escolhidas. Tomo 2. Lisboa: Ed. Avante!, 1984a.
______. Karl Marx. In: _____. Obras escolhidas. Tomo 2. Lisboa: Ed. Avante!, 1984b.
______. O oportunismo e a falência da II Internacional. In: _____. Obras escolhidas. Tomo 2. Lisboa: Ed. Avante!, 1984c.
PARTIDO COMUNISTA DA CHINA. Sobre o problema de Stalin. In: Núcleo de Estudos do Marxismo-Leninismo-Maoismo. A Carta Chinesa: a grande batalha ideológica que o Brasil não viu. Belo Horizonte: Terra, 2003a.
______. Acerca do falso comunismo de Kruschov e suas lições históricas para o mundo. In: Núcleo de Estudos do Marxismo-Leninismo-Maoismo. A Carta Chinesa: a grande batalha ideológica que o Brasil não viu. Belo Horizonte: Terra, 2003b.
SCHOPENHAUER, Arthur. Como vencer um debate sem precisar ter razão: em 38 estratagemas (Dialética Erística). Tradução Daniela Caldas e Olavo de Carvalho. Rio de Janeiro: Topbooks, 1997.
STALIN, J. V.. Sobre o Materialismo Dialético e o Materialismo Histórico (1938). In: Arquivo Marxista na Internet. Disponível em: <http://marxists.org/portugues/stalin/1938/09/mat-dia-hist.htm>. Acesso em 16 abr. 2012.
TSETUNG, Mao. Sobre a prática. In: O pensamento de Mao Tsé-Tung. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979a.
______. Abandonai as ilusões e preparai-vos para a luta. In: _____. Obras Escolhidas. Vol. IV. São Paulo: Alfa Omega, 1979b.
______. Sobre o tratamento correto das contradições no seio do povo. In: ______. Seis textos filosóficos do Presidente Mao Tsetung. São Paulo: Edições Seara Vermelha, 1999.


[1] Arthur Schopenhauer (1997), com sua dialética erística, apresenta 38 estratagemas retóricos, partindo da ideia de que o foco de cada parte num debate deve ser ganhar a discussão,  independentemente do significado das ideias defendidas e de serem verdadeiras ou não. Alguns estratagemas servem perfeitamente aos propósitos deste artigo: uso intencional de premissas falsas – lançar ideias baseadas em premissas falsas para que o adversário, discutindo as ideias, silencie sobre as premissas, admitindo-lhes tacitamente; manipulação semântica: utilização de termos que já tragam em si um significado prejudicial ao argumento do adversário; alternativa forçada – oferecer duas possibilidades para que o adversário só possa escolher entre uma ou outra, abrindo mão de seu argumento; falsa proclamação de vitória – tratar como prova o que não é prova, e “forçar a barra” para proclamar vitória num momento em que o adversário ou a plateia possam aceitar isso.

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